sábado, 24 de novembro de 2012

Roberto Polcan/ Eurico Rocha



ROBERTO POLCAN
'Criação' - Acrílico s/madeira ,2012



Dos muitos mitos que os humanos cultuamos ou padecemos o da Criação é tal vez o mais difundido em ocidente e também o mais polêmico. Falo aqui daqueles sete dias e o repouso conseqüente durante os quais das trevas fez-se a luz. Aplicado à arte, o termo muda de significado ou adquire um sentido mediado pela obra (a criatura) ou pela vida do artista que passa assim a ser o criador.

A pintura de Polcan aqui apresentada não apenas leva o título de “criação” como pretende mostrar alguns aspectos da paisagem alterada pela labor daquele outro criador ao longo de alguns daqueles sete dias. O que vemos parece ser essa paisagem turbulenta que, na perspectiva da mínima galeria, se agiganta e revela a luz, não aquela com L maiúsculo e sim a que vem do fundo da galeria, do jardim.
O prazer em pintar e o desborde dos materiais que vemos nesta tela lembram algumas pinturas conhecidas de Iberê Camargo, de Anselm Kieffer ou aqueles bárbaros de Berlim que tiveram seus quinze minutos de fama.
Aqui temos muito mais uma contenção meditativa: o esboço abreviado (e portátil) de um fenômeno mítico do que a expansão eufórica daqueles desenfreados, para nada portáteis.
O tema pode ser, portanto, inversamente proporcional ao tamanho assim como a dor a quem cria.



EURICO ROCHA

'bicho verde' - 40 x 40 cm acrílica s/tela, 2012




eurico rocha é provavelmente o mais portátil dos artistas que ocupam a galeria nesta exposição com a qual la mínima celebra a conspiração "shandy" que os dadaistas perpetraram na europa nos anos 20. eurico tem o dom de diseminar buena onda e servir tapioca por onde passa. na noite de abertura foi o responsável pelo shandy, mistura de cerveja e limonada com a qual emulamos os nossos pares da frança. "bicho verde" (obra que exibe na exposição) é um desborde de pinceladas rítmicas que pode ser tambem o convite a um mergulho no seu curioso mundo habitado por ciganos, freiras e odaliscas e onde cabe todo aquele que contesta, reclama, resiste, divide, humano ser o un hombre nuevo. pinta vagas nuvens nas horas vagas que nos remetem aos céus de brasilia onde tantas "cabeças" brilharam ao seu redor nos anos oitenta. carrega suas obras e os materiais de pintura de bicicleta, numa valise de couro muito duchampiana..




segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Fernando penteado/ juan Ojea/ Alfi Vivern



FERNANDO PENTEADO
'escrituras' / gaze, tinta, puffing, colagem, cortiça e PVC, 2012


escrituras (obra com a qual fernando penteado participa da coleção de shandys 40 x 40 cm, costura memórias e materiais que (mesmo tendo origens antagônicas a maioria das vezes) se harmonizam e convivem como se tivessem nascido (e crescido) juntos: eis a arte do ferpen que ocupa o mural da nossa página nestes dias que antecedem ao fim do mundo prognosticado pelos maias (teatral e midiaticamente ridículo).Ferpen carrega para o atelier restos do desperdício jogado na rua, antigos objetos que guardam em manchas e rasuras sua própria história, portáteis por essência e amáveis por excelência. Esta é a matéria prima de uma poesia têxtil (por chamá-la de algum modo) com a qual ocupou um grande salão na bienal e ocupa atualmente a sala envidraçada da mendes wood onde acaba de aportar. A obra, afixada com quatro tachas de sapateiro que Fernando trouxe para esse fim.




JUAN OJEA
“laranja partida” Wraping ,tecelagem. algodão e papel fotográfico




laranja partida (além do título desta obra) é uma das tantas "receitas" de tecelagem tradicional. suponho que se refira a uma sequencia de pontos a serem tecidos para obter um determinado desenho. neste caso el inquieto ojea nos brinda con... un juego de palabras donde el color (a cor) suplanta la fruta (naranja) y nos parte el alma (partida) pensando como con estes elementos essencialmente frios pode conseguir essa calidez, a ternura que brota dos fios e o equilibrio inestable que os rolinhos lançam sobre um fundo brilhante tramado de uma fotografia. belissimo trabalho que esta exposto em la minima galeria medindo 40 x 40 cm: portátil e shandy como poucos ja que vem acompanhado de uma embalagem primorosa para poder viajar com esta laranja aonde quiser inclusive circulando como bagagem nas esteiras dos melhores aeroportos do mundo. Agora bem, se alguém perguntar o que veio primeiro: o fundo tramado (como espelho fragmentado) ou a frente de sinuosos roulettes refletidos naquele fundo eu não sei responder. Pergunte ao Juan (está bastante em facebook) que nos informa que laranja partida pode ser comprada por 1.600 reais e a caixa onde viaja por 900.


ALFI VIVERN
'coração de pedra' - escultura – basalto e bronze - corte manual com punteira e pichote – fundição artesanal em areia



alfi vivern revela-nos "uma pequena ideia e um grande mistério". sua escultura é primordial, epifânica, descobre aos nossos olhos o coração de bronze de um ovo de basalto e assim ficamos atônitos, minimizados ante a constatação de que as pe...dras também amam, se metamorfoseam, também, em pães portáteis carregados por uma alça de couro, caixas em cujo interior um filão foi cortado em finas fatias: pequenos misterios e grandes ideias. em suas veias corre o sangue catalão de miró, o portenho de girondo, o curitibano de leminski. menires, labirintos, ferro e fogo com os quais este poeta e escultor deixa sempre pedra sobre pedra: a palavra como começo e fim de sua obra.









quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Jaime Prades

Jaime Prades

As ruínas urbanas são testemunhas da voracidade humana. Migalhas do apetite insaciável de um sistema devorador." Jaime Prades 





Há trinta anos, jaimito (como chamávamos ele nesse então) deixava sua marca em murais enormes nas paredes da cidade com a cumplicidade de Zé Carratu e Carlos Delfino, os tupinãodá. Esta tradição da modernidade reitera o suporte (ou um dos suportes) no qual trabalha hoje: as paredes (ou os restos delas). A diferença é que agora trata-se de paredes portáteis cujos retalhos ou entulhos podemos expor, carregar, levar para diferentes lugares: paredes que agora começam a cantar, latir, vibrar; a brilhar no escuro como diamantes e a gravar na nossa memória (como sempre) uma sensação que somente o prazer de viver pode dar.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

BETO MAINIERI
'sem título' - saída fotográfica adesivada em ps 2mm




isto que aqui vemos, detalhado na página de abertura, não é o céu nem as nuvens que beto mainieri viu no seu voo de paris a sao paulo pela janela do avião. o que aqui vemos é a memória que mainieri guarda daquelas paisagens, ordenadas pelo olhar distanciado daquela emoção, uma junção de fragmentos que nunca formam um todo e conservam, por isso mesmo, a fragilidade de cada um desses momentos representada pelo mutus liber das nuvens: trechos de oceanos, a ilha de cabo verde, variados cumulus e nimbus por doquier... Elaborar um caderno de nuvens pode ser tarefa inesgotável, prazerosa e bastante inútil: ou seja, praticamente uma obra de arte. aqui temos um exemplo disso em 40 x 40 cm. pode ser visto em la minima, galeria faltaria acrescentar que uma obra executada a essa altura e nessa velocidade é essencialmente portátil e que por isso consta do catálogo de artistas shandys.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

40 x 40 centímetros (diálogo de imagens)

 Mais de 40 obras e/ou artistas portáteis reunidos numa inusitada celebração.


La mínima, galeria fecha a temporada de exposições 2012 com uma coletiva cujo tema é o formato: 40 x 40 centímetros (diálogo de imagens). A característica portátil das obras oferece um marco propício para, acumuladas, apresentar uma densidade artística pouco comum e um diálogo cujo tema é o improviso (advindo precisamente dessa proximidade). Em outras palavras (quiçá mais claras): o pequeno formato permite apresentar uma grande quantidade de artistas em uníssono e essa proximidade provoca um diálogo cujo resultado depende do acaso, algo assim como uma interação inesperada com quem menos você imagina encontrar num local totalmente fortuito ou improvável. A arte, neste caso, atenua essa disparatada forma de diálogo e a converte numa exposição temática. Os artistas (e amigos) convidados seguem em rigorosa ordem alfabética (já que alguma ordem deve ser anteposta ao caos que desta iniciativa deverá surgir)



A modo de explicação


O museu portátil como uma coleção de imagens virtuais dentro de um HD ou milhares deles armazenados numa nuvem e acessíveis através de um dígito apertando uma única tecla: eis o cumulo do portátil, eis o mais denso dos panoramas.
Esta recente e banal forma de colecionar dados e imagens não existia quando duchamp, picabia e seus amigos dadás, criaram a sociedade secreta dos artistas portáteis descrita com todas suas peripécias e aventuras mirabolantes por enrique vila-matas na história abreviada da literatura portátil (1985). A história  narra as andanças de um grupo de intelectuais, pintores e escritores que, em 1924, decidem fundar uma sociedade secreta. Conhecidos como portáteis ou shandys – uma homenagem a Tristram Shandy, personagem de Laurence Sterne e a um refresco a base de cerveja – o grupo, seletíssimo e obscuro, tem entre seus ideais o amor à escrita como diversão, o espírito inovador e a autoria de obras que pudessem caber facilmente em uma maleta ou “valise” como duchamp bem disse. (ou debaixo do braço de uma criança, como digo bem eu com a trena marcando 40 centímetros).
O vila-matas (op.cit) lembra algumas passagens memoráveis desses dadaístas que aqui transcrevo:
o que foi reduzido se acha, de certa forma, livre de significado. Sua pequenez é, ao mesmo tempo, um todo e um fragmento. O amor ao pequeno é uma emoção infantil” duchamp.


só as sensações mínimas e de coisas pequeníssimas são as que vivo intensamente. Talvez isso acontece por causa do meu amor ao fútil... é por que o mínimo por não ter em absoluto nenhuma importância social ou prática tem, por causa dessa mera ausência, uma independência absoluta de associações turvas (ou difusas) com a realidade. O mínimo me soa sempre irreal, até os livros inspirados preferíamos curtos”. George Antheil


Ao que Paladino, o curador, acrescenta: até as grandes obras preferimos pequenas, ou mínimas, como a nossa galeria.


Celebramos assim aquela sociedade dos anos 20, não menos secreta do que efêmera que vila-matas descreve com suma propriedade e sugerimos o tamanho (mínimo) como estratégia estética contraposta ao gigantismo da cidade que ruge da pequena porta da galeria para fora. Aqui dentro imperam: o silêncio de Cage, o vazio do mundo e a cor inexistente.